Conteúdos &
Notícias

A Assessoria Popular Maria Felipa acredita no poder da informação para conscientizar e mobilizar a sociedade em questões de direitos humanos, justiça e liberdade. E sabemos que uma das melhores maneiras de compartilhar informações é através de artigos escritos por pessoas como você. Seja você um ativista, um acadêmico, um jornalista ou apenas alguém que quer contribuir, envie seu artigo para nós.


Compartilhe sua opinião, história, pesquisa ou visão sobre os assuntos que importam para você e para a sociedade.



Junte-se a nós e ajude a construir um futuro mais justo e livre para todas as pessoas.

Assessoria Popular Maria Felipa na ONU em Nova York
Por Fernanda Oliveira 12 mai., 2023
A Assessoria Popular Maria Felipa teve a honra de participar do debate "The Fight for Full Justice for Incarcerated Women in Brazil" na histórica Universidade de Columbia, em parceria com Brazil Talk, Institute of Latin American Studies e Lemann Center for Brazilian Studies.

Outros Artigos

08 dez., 2023
Fonte: https://unric.org/pt/wp-content/uploads/sites/9/2023/10/PT-UDHR-v2023_web.pdf  Introdução A Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas a 10 de dezembro de 1948, no Palais de Chaillot em Paris, foi elaborada para responder diretamente às calamidades e atos bárbaros vividos pelos povos do mundo durante a Segunda Guerra Mundial. A Declaração dá corpo aos valores universais que transcendem culturas, nações e regiões, e proclama os direitos inalienáveis aos quais todos os seres humanos, independentemente da sua raça, cor, religião, sexo, idioma, opinião política ou outra, origem nacional ou social, propriedade, nascimento ou outra condição têm inerentemente direito enquanto seres humanos. O texto é composto por 30 artigos. Em junho de 1946, após o conflito mais mortal que o mundo já havia visto, o recém-criado Conselho Económico e Social das Nações Unidas estabeleceu a Comissão de Direitos Humanos, composta por 18 membros de várias nacionalidades e origens políticas. A Comissão, órgão permanente das Nações Unidas, foi constituída para conceber e redigir o texto. Estabeleceu um Comité Especial de Redação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, presidido por Eleanor Roosevelt, para redigir os artigos da Declaração. O Comité reuniu-se em duas sessões ao longo de dois anos. O canadiano John Peters Humphrey, diretor da Divisão de Direitos Humanos do Secretariado das Nações Unidas, foi encarregue pelo secretário-geral das Nações Unidas de trabalhar no projeto. A ele juntaram-se outros especialistas de renome, incluindo René Cassin de França, Charles Malik do Líbano, Peng-chun Chang da China, William Hodgson da Austrália, Hernán Santa Cruz do Chile, Alexander Bogomolov da União Soviética e Charles Dukes (Lord Dukeston) do Reino Unido. Humphrey forneceu o rascunho inicial que se tornou o texto de trabalho da Comissão. Depois de o Comité ter terminado o seu trabalho em maio de 1948, o projeto foi discutido pela Comissão de Direitos Humanos, o Conselho Económico e Social e o Terceiro Comité da Assembleia Geral antes de ser submetido a votação em dezembro de 1948. Muitas emendas e propostas foram feitas pelos Estados-membros da ONU durante o processo. Hoje, a Declaração Universal dos Direitos Humanos é o texto mais traduzido em todo o mundo. Um testemunho da sua própria universalidade. Preâmbulo Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo; Considerando que o desconhecimento e o desprezo dos direitos do Homem conduziram a atos de barbárie que revoltam a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que os seres humanos sejam livres de falar e de crer, libertos do terror e da miséria, foi proclamado como a mais alta inspiração do Homem; Considerando que é essencial a proteção dos direitos do Homem através de um regime de direito, para que o Homem não seja compelido, em supremo recurso, à revolta contra a tirania e a opressão; Considerando que é essencial encorajar o desenvolvimento de relações amistosas entre as nações; Considerando que, na Carta, os povos das Nações Unidas proclamam, de novo, a sua fé nos direitos fundamentais do Homem, na dignidade e no valor da pessoa humana, na igualdade de direitos dos homens e das mulheres e se declaram resolvidos a favorecer o progresso social e a instaurar melhores condições de vida dentro de uma liberdade mais ampla; Considerando que os Estados-membros se comprometeram a promover, em cooperação com a Organização das Nações Unidas, o respeito universal e efetivo dos direitos do Homem e das liberdades fundamentais; Considerando que uma conceção comum destes direitos e liberdades é da mais alta importância para dar plena satisfação a tal compromisso: A Assembleia Geral proclama a presente Declaração Universal dos Direitos Humanos como ideal comum a atingir por todos os povos e todas as nações, a fim de que todos os indivíduos e todos os órgãos da sociedade, tendo-a constantemente no espírito, se esforcem, pelo ensino e pela educação, por desenvolver o respeito desses direitos e liberdades e por promover, por medidas progressivas de ordem nacional e internacional, o seu reconhecimento e a sua aplicação universais e efetivos tanto entre as populações dos próprios Estados-membros como entre as dos territórios colocados sob a sua jurisdição. Artigo 1° Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade. Artigo 2° Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamados na presente Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação. Além disso, não será feita nenhuma distinção fundada no estatuto político, jurídico ou internacional do país ou do território da naturalidade da pessoa, seja esse país ou território independente, sob tutela, autónomo ou sujeito a alguma limitação de soberania. Artigo 3° Todo o indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal. Artigo 4° Ninguém será mantido em escravatura ou em servidão; a escravatura e o trato dos escravos, sob todas as formas, são proibidos. Artigo 5° Ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes. Artigo 6° Todos os indivíduos têm direito ao reconhecimento, em todos os lugares, da sua personalidade jurídica. Artigo 7° Todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm direito a igual proteção da lei. Todos têm direito a proteção igual contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação. Artigo 8° Toda a pessoa tem direito a recurso efetivo para as jurisdições nacionais competentes contra os atos que violem os direitos fundamentais reconhecidos pela Constituição ou pela lei. Artigo 9° Ninguém pode ser arbitrariamente preso, detido ou exilado. Artigo 10° Toda a pessoa tem direito, em plena igualdade, a que a sua causa seja equitativa e publicamente julgada por um tribunal independente e imparcial que decida dos seus direitos e obrigações ou das razões de qualquer acusação em matéria penal que contra ela seja deduzida. Artigo 11° 1. Toda a pessoa acusada de um ato delituoso presumese inocente até que a sua culpabilidade fique legalmente provada no decurso de um processo público em que todas as garantias necessárias de defesa lhe sejam asseguradas. 2. Ninguém será condenado por ações ou omissões que, no momento da sua prática, não constituíam ato delituoso à face do direito interno ou internacional. Do mesmo modo, não será infligida pena mais grave do que a que era aplicável no momento em que o ato delituoso foi cometido. Artigo 12° Ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio ou na sua correspondência, nem ataques à sua honra e reputação. Contra tais intromissões ou ataques toda a pessoa tem direito a proteção da lei. Artigo 13° 1. Toda a pessoa tem o direito de livremente circular e escolher a sua residência no interior de um Estado. 2. Toda a pessoa tem o direito de abandonar o país em que se encontra, incluindo o seu, e o direito de regressar ao seu país. Artigo 14° 1. Toda a pessoa sujeita a perseguição tem o direito de procurar e de beneficiar de asilo em outros países. 2. Este direito não pode, porém, ser invocado no caso de processo realmente existente por crime de direito comum ou por atividades contrárias aos fins e aos princípios das Nações Unidas. Artigo 15° 1. Todo o indivíduo tem direito a ter uma nacionalidade. 2. Ninguém pode ser arbitrariamente privado da sua nacionalidade nem do direito de mudar de nacionalidade. Artigo 16° 1. A partir da idade núbil, o homem e a mulher têm o direito de casar e de constituir família, sem restrição alguma de raça, nacionalidade ou religião. Durante o casamento e na altura da sua dissolução, ambos têm direitos iguais. 2. O casamento não pode ser celebrado sem o livre e pleno consentimento dos futuros esposos. 3. A família é o elemento natural e fundamental da sociedade e tem direito à proteção desta e do Estado. Artigo 17° 1. Toda a pessoa, individual ou colectiva, tem direito à propriedade. 2. Ninguém pode ser arbitrariamente privado da sua propriedade. Artigo 18° ]Toda a pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião; este direito implica a liberdade de mudar de religião ou de convicção, assim como a liberdade de manifestar a religião ou convicção, sozinho ou em comum, tanto em público como em privado, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pelos ritos. Artigo 19° Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de expressão. Artigo 20° 1. Toda a pessoa tem direito à liberdade de reunião e de associação pacíficas. 2. Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação. Artigo 21° 1. Toda a pessoa tem o direito de tomar parte na diretamente dos negócios públicos do seu país, quer diretamente, quer por intermédio de representantes livremente escolhidos. 2. Toda a pessoa tem direito de acesso, em condições de igualdade, às funções públicas do seu país. 3. A vontade do povo é o fundamento da autoridade dos poderes públicos: e deve exprimir-se através de eleições honestas a realizar periodicamente por sufrágio universal e igual, com voto secreto ou segundo processo equivalente que salvaguarde a liberdade de voto. Artigo 22° Toda a pessoa, como membro da sociedade, tem direito à segurança social; e pode legitimamente exigir a satisfação dos direitos económicos, sociais e culturais indispensáveis, graças ao esforço nacional e à cooperação internacional, de harmonia com a organização e os recursos de cada país. Artigo 23° 1. Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições equitativas e satisfatórias de trabalho e à proteção contra o desemprego. 2. Todos têm direito, sem discriminação alguma, a salário igual por trabalho igual. 3. Quem trabalha tem direito a uma remuneração equitativa e satisfatória, que lhe permita e à sua família uma existência conforme com a dignidade humana, e completada, se possível, por todos os outros meios de proteção social. 4. Toda a pessoa tem o direito de fundar com outras pessoas sindicatos e de se filiar em sindicatos para defesa dos seus interesses. Artigo 24° Toda a pessoa tem direito ao repouso e aos lazeres, especialmente, a uma limitação razoável da duração do trabalho e as férias periódicas pagas. Artigo 25° 1. Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos serviços sociais necessários, e tem direito à segurança no desemprego, na doença, na invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade. 2. A maternidade e a infância têm direito a ajuda e a assistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora do matrimónio, gozam da mesma proteção social. Artigo 26° 1. Toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos a correspondente ao ensino elementar fundamental. O ensino elementar é obrigatório. O ensino técnico e profissional dever ser generalizado; o acesso aos estudos superiores deve estar aberto a todos em plena igualdade, em função do seu mérito. 2. A educação deve visar à plena expansão da personalidade humana e ao reforço dos direitos do Homem e das liberdades fundamentais e deve favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais ou religiosos, bem como o desenvolvimento das atividades das Nações Unidas para a manutenção da paz. 3. Aos pais pertence a prioridade do direito de escolher o género de educação a dar aos filhos. Artigo 27° 1. Toda a pessoa tem o direito de tomar parte livremente na vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar no progresso científico e nos benefícios que deste resultam. 2. Todos têm direito à proteção dos interesses morais e materiais ligados a qualquer produção científica, literária ou artística da sua autoria. Artigo 28° Toda a pessoa tem direito a que reine, no plano social e no plano internacional, uma ordem capaz de tornar plenamente efetivos os direitos e as liberdades enunciadas na presente Declaração. Artigo 29° 1. O indivíduo tem deveres para com a comunidade, fora da qual não é possível o livre e pleno desenvolvimento da sua personalidade. 2. No exercício deste direito e no gozo destas liberdades ninguém está sujeito senão às limitações estabelecidas pela lei com vista exclusivamente a promover o reconhecimento e o respeito dos direitos e liberdades dos outros e a fim de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar numa sociedade democrática. 3. Em caso algum estes direitos e liberdades poderão ser exercidos contrariamente e aos fins e aos princípios das Nações Unidas. Artigo 30° Nenhuma disposição da presente Declaração pode ser interpretada de maneira a envolver para qualquer Estado, agrupamento ou indivíduo o direito de se entregar a alguma atividade ou de praticar algum ato destinado a destruir os direitos e liberdades aqui enunciados.
Por Fernanda Oliveira 02 nov., 2023
No dia 08 de março de 2020, a Assessoria Popular Maria Felipa [4] , uma articulação de advogadas populares que atuam na perspectiva do abolicionismo penal a fim de garantir e ampliar o acesso à justiça – sobretudo na compreensão da necessidade de enfrentar o encarceramento em massa de forma intransigente, individualizada e qualificada –, expõe e questiona os desafios cotidianos de lidar com a invisibilidade do invisível: as mulheres mães e/ou grávidas encarceradas. O título do nosso artigo expressa a ideia de que se o encarceramento já é invisível para a sociedade, quando se trata de encarceramento de mulheres existe uma invisibilidade dentro do invisível. Entendendo essa invisibilidade a Assessoria Popular Maria Felipa desenvolve, desde 2017, o Projeto Solta Minha Mãe, utilizando das ferramentas disponíveis na estrutura do Sistema de Justiça Criminal do Brasil para buscar a redução da população prisional feminina. Ressalta-se que o Projeto Solta Minha Mãe é financiado pelo Fundo Brasil de Direitos Humanos, viabilizando o acesso à justiça. A primeira etapa do projeto, de 2017 a março de 2019, inicia-se atuando em casos de mulheres já sentenciadas, em três unidades prisionais da região metropolitana de Belo Horizonte, realizando pedidos de perdão de pena nos marcos dos dois decretos de indulto publicados com atenção às mulheres no dia das mães de 2017 e 2018. Durante a execução, apesar da decisão de 2018 do Supremo Tribunal Federal, o Habeas Corpus Coletivo 143.641/SP – que confirmou a possibilidade de presas provisórias, gestantes e mães de filhos até 12 anos, aguardarem o julgamento em prisão domiciliar –, observamos ainda a permanência de um grande volume de mães e gestantes encarceradas. Portanto, nessa segunda etapa do projeto, em execução desde agosto de 2019, a atuação é específica às presas provisórias do Centro de Referência à Gestante Privada de Liberdade, em Vespasiano, Minas Gerais, com o objetivo de dar efetividade à referida decisão do Supremo Tribunal Federal e de garantir o direito legalmente previsto. Refletimos sobre o óbvio que deveria ensejar no mínimo uma reflexão, mesmo após essa decisão do STF, há uma unidade prisional destinada às mulheres grávidas, sendo que 80 % são presas provisórias. Se na estrutura social as mulheres negras são a base da pirâmide, como afirma Angela Davis [5] , se elas se movimentam toda a pirâmide se movimenta. Logo, quando se trata das mulheres, as mulheres presas são a base de toda a pirâmide, sendo elas alcançadas por todas as violências que também atravessam as demais mulheres , com o acréscimo de vivenciarem o sistema de justiça criminal. Um sistema que se estrutura em uma concepção racista, machista e seletiva, como Salo de Carvalho ensina
Análise: Democracia e participação social na prevenção e combate à tortura
12 mai., 2023
Análise: Democracia e participação social na prevenção e combate à tortura
Denúncias de violação de direitos no sistema prisional aumentaram
Por Fernanda Oliveira 07 mai., 2023
Levantamento realizado pela Pastoral Carcerária, obtido com exclusividade pela Agência Pública, revela que, em um ano de pandemia, houve um aumento de 82% nas denúncias envolvendo violações de direitos em relação ao mesmo período do ano anterior. Entre 15 de março de 2019 e 14 de março de 2020, o total foi de 92 denúncias. Já de 15 de março de 2020 a 14 de março de 2021, foram 168. Dentre os tipos de queixas recebidas, as mais recorrentes estão relacionadas à negligência na prestação da assistência à saúde (109 casos), falta ou assistência precária no fornecimento de alimentação, vestuário, produtos de higiene pessoal e limpeza (91) e agressões físicas (89). Quando somadas as espécies de violações, o número absoluto chega a 557. Isso acontece porque num único caso pode haver mais de um tipo de violência. “ S e um familiar ou o próprio preso faz uma denúncia falando que não está recebendo atendimento médico e ao mesmo tempo está sofrendo uma agressão física ou não está recebendo alimentação adequada, a gente faz um único caso no cadastro e coloca a espécie da violência. Então esse único caso, por exemplo, vai ter três espécies de violência. A partir do número de casos fazemos essa diferenciação ”, explica Lucas Gonçalves, assessor jurídico da Pastoral Carcerária Nacional. Gonçalves é o responsável pelo recebimento e acompanhamento das denúncias e também por alertar os órgãos do sistema de justiça criminal. Porém, ele ressalta que é difícil precisar a quantidade de vítimas das denúncias. “ Tem denúncias de envolvem mais de uma ala da unidade prisional ou a unidade inteira. Então, a gente não consegue quantificar de alguma forma o número de vítimas, mas consegue fazer a qualificação da espécie de violência ”, diz. Pandemia foi instrumentalizada para causar mortes, diz agente da Pastoral Em um ano, Gonçalves avalia que a pandemia teve dois efeitos na situação dos presos. “ Ela foi instrumentalizada pelas autoridades públicas e pelos órgãos de justiça criminal para produzir doença e morte nas pessoas presas ”, afirma. Ao mesmo tempo, “ fechou ainda mais a instituição carcerária — que já é uma instituição fechada. Então, com a suspensão das visitas religiosas, com a suspensão das visitas dos familiares, as violências que já aconteciam no presídio tornaram-se ainda mais invisíveis durante a pandemia ”, aponta. Com o cancelamento das visitas, familiares ficaram sem acesso às unidades e sem ter informações sobre os seus parentes por meses. Rafaela*, 54, moradora de Manhumirim, Minas Gerais, tem um filho no Presídio de Manhumirim I e teve uma filha encarcerada no Presídio de Timóteo I, que acaba de ter a prisão relaxada. “ Eles ligam uma vez por mês pra gente, depois ficam dois, três meses sem [poder] ligar. Eles sorteavam os que iam ligar. E a gente não sabe o que está acontecendo ”, relata. De acordo com Rafaela — que pediu para não ter o nome completo divulgado por temer represálias — , os familiares precisam muitas vezes ir até a porta das unidades prisionais para obter algum tipo de informação. Além disso, são recorrentes os relatos de violência. “ A gente está sabendo, através de advogados, que está havendo muita violência lá dentro, dos agentes com os presos. Xingamentos, tiro de borracha, houve já dois casos em que atiraram num preso com tiro de borracha, spray de pimenta ”, ela conta. Também foram impostas barreiras no envio de produtos de alimentação e higiene aos encarcerados. Segundo Rafaela, os familiares têm que remeter pelo correio. Depois, os produtos ficam 15 dias “isolados” antes de serem entregues. “ Já aconteceu, nesse tempo, de rato comer. Porque a gente manda biscoito, manda bolo, que tem uma lista do que pode mandar. Quando vão dar para a pessoa, está tudo estragado, mofado. O rato estava comendo os biscoitos l á”, afirma a dona de casa. Levantamento obtido pela Pública mostra que houve aumento de 82% nas denúncias envolvendo violações de direitos no sistema prisional brasileiro em relação ao mesmo período do ano anterior Alimentos como estratégia de tortura O cenário se repete nas unidades prisionais do Distrito Federal. “ A Covid veio para fomentar o que o estado já faz, que é a legitimação de morte da pessoa encarcerada ”, afirma Eveline Duarte, 35, representante da Agenda Nacional pelo Desencarceramento. Por lá, em meio à pandemia, presos do Complexo Penitenciário da Papuda ficaram cegos após serem alvejados por tiros de bala de borracha a menos de um metro de distância. “ A Covid veio para fomentar o que o estado já faz, que é a legitimação de morte da pessoa encarcerada” , afirma Eveline Duarte, representante da Agenda Nacional pelo Desencarceramento Madrasta e esposa de pessoas em privação de liberdade, ela também relata precariedade na alimentação oferecida aos detentos. “ O direito à alimentação da pessoa presa é [utilizado como] uma estratégia de tortura. Preso que encontrou mosca, filmagem de lesmas, no ano passado, em meio à Covid, sendo encontradas dentro das marmitas. E sem os mecanismos de fiscalização, a situação é de números crescentes de denúncias. Isso porque está sem visita. A visita é essa fonte de denúncia ”, aponta. De acordo com o assessor jurídico da Pastoral, Lucas Gonçalves, as violências ocorridas ao longo do último ano foram “ bem cruéis ”. “ A gente recebeu denúncias de agentes penitenciários utilizando de diversos instrumentos para produzir e reproduzir violência contra essas pessoas. Desde spray de pimenta, bomba de efeito moral, uso de cassetete, uso de fios, uso de vassoura, dentre outros instrumentos torturantes ”, explica. “ A pandemia fez aumentar a falta de informação, fez aumentar o isolamento e entendemos a tortura também como crime de oportunidade. A incomunicabilidade causada pelas medidas restritivas que a pandemia acabou impondo, favorecem as práticas de tortura que ganham um terreno fértil pra proliferarem ”, aponta o perito do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate a Tortura (MNPCT) Daniel Melo. Recentemente, a advogada da Assessoria Popular Maria Felipa, de Minas Gerais, Nana Oliveira, recebeu a denúncia da esposa de uma pessoa presa na unidade de Formiga, relatando que a sua visita virtual não aconteceria “porque o marido dela estava machucado ”. “ A assistente social falou isso pra ela sem nenhum constrangimento. Já passaram da barreira do constrangimento, agora já está assim ”, conta a advogada, que compõe a Agenda Nacional pelo Desencarceramento e a Frente Estadual pelo Desencarceramento de MG. Quando os casos de contaminação por Covid-19 começaram a se intensificar, o MNPCT parou de fazer visitas que já estavam programadas. No segundo semestre de 2020, com a diminuição dos casos, as inspeções foram retomadas e eles conseguiram identificar uma série de problemas: “ havia um baixo rigor no uso de protocolos [de combate à disseminação do vírus]: falta de uso de máscaras pelo profissionais, falta de insumos, incomunicabilidade pela falta de contato familiar, sanções coletivas, a falta de conhecimento das pessoas presas diante as medidas que estavam sendo tomadas ”, explica Daniel. “ Fora as violências já clássicas: alimentação, falta de água, uso excessivo da força ”.

Somos Comunidade

Junte-se à nossa comunidade e tenha acesso

exclusivo a informações de primeira mão.

Contact Us

Share by: